quinta-feira, abril 19, 2007

PARA VOCÊ REFLETIR...


As Duas Canções do Homem e os sons secretos da cítara indiana.
Rubem Alves - 1993 - Revista Reformador

Bom lembrar, a quem não sabe, que a cítara é composta de duas camadas de cordas superpostas, uma sobre a outra, muito próximas, sem nunca se tocarem. A camada de cima é sensibilizada pelo músico, e a de baixo não pode nunca ser tocada pelos dedos.
Quem pouco entende dos segredos sonoros pode perguntar-se por que razão um instrumento musical tem cordas que não são tocadas.
A beleza desse mistério está justamente na harmonia que enlaça as duas camadas.
Os dedos não tocam a de baixo para que suas cordas possam vibrar pela magia de uma coisa muito mais sutil que os dedos.
Tangidas pelos sons que brotam das primeiras, elas reverberam e fazem nascer uma outra música, diversa daquela que o artista produziu.
Eis o segredo. Eis a sensibilidade.
Olhemos agora para nós.
Quem sabe sejamos cítaras humanas, que vivem dentro de um encanto chamado vida, provocado pelo carinho criador de Deus;
Lá dentro, no fundo de nossa essência, estão as segundas cordas de uma única verdade, que os dedos nunca tocam, mas que fazem ouvir uma outra voz, a vibrar pelos escaninhos do silêncio...
Vem de lá uma canção imortal, jamais tocada, mas que, se ouvida, pode dizer muito de nós. Talvez seja esta a melodia diferente que os bons médiuns ouvem.
Aqueles que lêem com amor o não-dito das palavras humanas, separando a mentira da verdade, o joio do trigo, e escolhendo o bem.
Talvez seja, essa música oculta, a melhor definição de amizade. Afinal, o que um amigo faz senão educar-se para escutar nosso silêncio, que às vezes busca um abraço, um momento de atenção para aplacar sua melancolia?
Um amigo é também algo mais. É aquele que faz do seu sossego um recanto confiável, onde o outro pode guardar seus segredos e não ter medo de perdê-los.
Um amigo é aquele onde nossa segunda pauta encontra eco, porque sabe que no âmbito da amizade a solidão é um convite ao recolhimento, para que sejamos ouvidos, para que possamos reverberar.
Nos braços de um amigo, nossa solidão se dilui no suave aroma da partilha. Você, a quem muitos consideram verdadeiro irmão, pode treinar os ouvidos do sentimento para escutar uma nova melodia.
Preste, porém, menos atenção no que as pessoas irão tocar e mais nos sons daquelas cordas que nunca serão tangidas. Aproveite, também para apreciar a beleza da música que brota de todo lugar.Aí escutará a segunda canção de Deus, convidando-o a que habite uma realidade nova: a de ser, finalmente, um bom e melhor amigo, que com muito amor, aprendeu a chamar os outros para fora da solidão.

Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei linda!!!!!!!!
Oi prima, tudo bom??
Tem um convite para vc no meu blog.
Vai até lá.............

Bejus Ruth Piancó